Onze em cada 10 analistas políticos apontam a polarização como um problema central na vida nacional. Aqui da planície, sem diploma e a olho nu, perguntamos: que polarização?
Qualquer especialista daria gargalhada diante dessa pergunta. Não tá vendo a polarização, distraído? Aqui da planície, sem mestrado, muito menos doutorado, respondemos humildemente: não. Não estamos vendo a polarização. Qual polarização?
O analista político a essa altura já perdeu a paciência, já mandou estudar e já perguntou se quer que ele desenhe. Respondemos pacientemente que não precisa desenhar – até porque desenhar não é tão fácil quanto parece – basta responder mesmo. E a resposta (boa) nunca virá. Virão sempre os desenhos infantis de direita x esquerda, progressistas x conservadores (tem certeza que sabe quem é quem?).
Ah, mas o problema é o Bolsonaro. Ou o fora Bolsonaro. Essa é a polarização.
Ah, é? E o Temer? O problema não era o Temer? Fora Temer! Ah, já saiu? E quem apoiava o Temer agora apoia o Bolsonaro? Não?! Só alguns? Muitos dos que eram Fica Temer são Fora Bolsonaro?? Vixe, aí complica. Êta, polarização difícil.
E tem aqueles (muitos) que gritavam Fora Dilma dizendo que o problema era a esquerdalha e estão aí agora gritando Fora Bolsonaro… Isso é que é uma bússola inquieta! Uma coisa é certa: gritar “fora” alguém já fez a cama e encheu barriga de muita gente.
Voltando à estranha polarização: quando FHC lançou o Plano Real – considerado por essas caricaturas políticas como um plano neoliberal de direita – tinha muito autointitulado patriota conservador pedindo Fora FHC. Hoje apoiam Bolsonaro, que por sua vez retomou com Paulo Guedes a agenda “neoliberal” iniciada por FHC.
Que polarização é essa? Seria uma polarização multipolar? Ou só um carnaval de conceitos mal-ajambrados para a construção de uma guerra artificial? A quem interessa essa guerra?
Em termos mercadológicos, interessa com certeza a muita gente. Dividir a existência em “dois lados” e sair catequizando inocentes úteis para o “lado certo” contra o “lado errado” dá grana, dá voto, dá poder e pode dar até prestígio e charme. Só não confunda por favor mercado com política, com filosofia ou com ética. Mercado é mercado. Vai um salvacionismo aí? É só 1,99.
Então vamos voltar um pouquinho à história, que costuma ensinar mais que lição sumária de Facebook. Quando Collor estava sangrando – depois do plano stalinista da Zélia (e o governo era de direita…) – assumiu o comando da economia o embaixador Marcílio Marques Moreira. Ele fez a transição das aventuras anteriores para um choque de gestão liberal e iniciou a arrumação da casa.
Foi justamente quando veio o impeachment e a “salvação” trazida por Itamar Franco era um ministro da Fazenda sem traquejo na área. Os indicadores macroeconômicos voltaram à sua trajetória ladeira abaixo e a equipe do Real só veio no quarto ministro da Fazenda de Itamar (FHC). Entendeu como nem sempre é muito simples dizer onde está o Bem?
Pois o Bem esteve e tem estado em variados recantos da experiência política completamente dissociado da suposta polarização e das dicotomias burras. Falar do “Bem” aqui não é pretensão moralista – estamos só referindo a fatos com resultados reconhecivelmente positivos. Então vamos lá.
O Bem esteve presente nos estertores do governo Collor; no momento em que Itamar estava perdido na tempestade; no primeiro mandato de FHC; no início do governo Lula – quando o Real ironicamente foi salvo da crise enfrentada pelo seu criador, antes da banda podre dominar a administração petista –; no governo Temer (com a recuperação do equilíbrio fiscal); no governo Bolsonaro (com a retomada da agenda de reformas).
A quem interessa caricaturar tudo e investir numa polarização farsesca, como se estivéssemos todos num túnel do tempo rumo ao Muro de Berlim? Quem ganha com isso?
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