Ainda transcorrem nos Estados Unidos as investigações sobre a interferência russa para ajudar na vitória de Trump, há dois anos — em que o Facebook foi usado para distribuir notícias falsas, fake news, sobre a candidata democrata Hillary Clinton —, e surge outro escândalo muito semelhante, também envolvendo a rede social de Mark Zuckerberg.
No primeiro caso de manipulação eleitoral, foi informado depois, pelo próprio Facebook, que grupos russos difundiram 80 mil posts na rede, durante mais de dois anos, com mensagens que foram vistas por 126 milhões de americanos. Twitter e Google também foram usados para difundir este tipo de material.
A nova história é mais intrincada, também envolve o Facebook e ocorreu em torno das mesmas eleições de 2016, novamente para favorecer Trump, mas não só.
Uma empresa contratada pela campanha de Trump, a Cambridge Analytica, de consultoria, teve acesso a dados de perfil de navegação de 50 milhões de usuários do Facebook, a partir de um aplicativo colocado na rede. Ele foi baixado por 270 mil pessoas, e a partir delas levantaram-se informações dos 50 milhões.
Com esta massa de dados, a Analytica formatou, desde 2014, campanhas políticas dirigidas a alvos definidos a partir daqueles milhões de perfis. Inclusive, no Brexit, na Grã-Bretanha.
Sugestivo que o trabalho da Analytica tenha sido supervisionado por Stephen Bannon, ideólogo de extrema-direita, conselheiro especial de Trump no início do governo. O trabalho foi financiado pelo bilionário Robert Mercer, que também fez grandes doações à campanha do candidato republicano.
Se no caso dos russos ficou evidente o risco que correm as sociedades abertas com essas grandes plataformas digitais — há um duopólio mundial de Facebook e Google —, na operação executada pela Cambridge Analytica, com Bannon nas proximidades, ocorreu uma inominável invasão de privacidade.
Esta é outra faceta deste mundo novo: enquanto circulam enxurradas de supostas informações misturadas com opiniões, sem que os consumidores desses maremotos de dados tenham condições de avaliar o que é verdade e o que é mentira, a vida privada tornou-se um conceito do passado. E a privacidade dos cidadãos é essencial na democracia. Mas também as pessoas precisam saber que essas plataformas digitais gigantescas, que operam de forma automática, não são fontes confiáveis.
Confirma-se que é essencial para a própria democracia que o fluxo de informações, de dados e de opiniões na sociedade seja feito de forma transparente e que haja cada vez mais consciência dos usuários desses sistemas digitais de difusão de textos, áudios e imagens que tecnologia por si só não garante confiabilidade. As eleições que se aproximam poderá ser um teste de manipulação para os brasileiros.
O Globo
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