Apesar de a inflação ter dado sinais de desaceleração nos últimos três meses, um dos itens mais importantes do consumo pessoal, as roupas, não têm dado trégua nos preços. Em um ano, conforme os dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os custos com itens do setor de vestuário subiram 19,16%, a maior inflação para a categoria desde 1995.
Entre as maiores altas, destacam-se as roupas masculinas, cujos preços acumulam elevação de 22,28% nos 12 meses encerrados em setembro, de acordo com os dados do IBGE. Na categoria feminina, a maior alta foi do item vestido, que avançou 25,14%, na mesma base de comparação. O segmento de roupa infantil acumulou alta 15,63% em 12 meses, com destaque para os agasalhos, que tiveram ficaram 20,68% mais caros em um ano.
“Os preços de tudo vem subindo e normalmente isso é repassado para o preço do produto ao nosso cliente. Infelizmente, não tem como segurar”, afirma o gerente comercial de uma loja de roupas masculinas no Brasília Shopping, Ladmir Bilhão. Mesmo com a carestia dos itens de vestuário, o movimento das lojas ainda é bastante positivo, tendo em vista o quanto o setor sofreu com a pandemia, com os shoppings fechados.
Mas é preciso manter as estratégias para atrair clientes, sobretudo em forma de promoções. “Mantemos sempre uma promoção ou outra para que possa trazer o cliente até a loja. Lógico que, em alguns produtos, não dá para dar desconto. O repasse de custos foi muito grande”, destaca.
Disparada
O setor de confecções vem operando com várias pressões inflacionárias desde agosto de 2020, no auge da pandemia da covid-19. “Naquele momento as pressões derivadas dos aumentos de custo começaram a bater nas relações comerciais com varejo e as pressões inflacionárias vinham trazendo muito estresse para todas as indústrias, principalmente aquelas que dependiam do algodão. Esse cenário continuou a ocorrer durante todo o primeiro semestre de 2022”, destaca o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel.
Em meados de junho deste ano, o algodão alcançou o maior preço dos últimos 10 anos e, em dois anos, o quilo da commodity agrícola chegou a subir cerca de 150%. “Isso pressiona violentamente os preços para o produtor têxtil e, obviamente, acaba chegando ao varejo. A inflação acumulada em setembro no grupo de vestuário vem de tudo que a indústria tem passado também nos últimos meses”, afirma Pimentel.
De acordo com o coordenador dos Índices de Preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), Andre Braz, além da alta da matéria-prima, o setor de vestuário teve de lidar com custos muito elevados, que acabaram encarecendo o produto final. Foi o caso da energia elétrica, que movimenta as máquinas para fabricação de tecidos, e do diesel, que impacta diretamente no custo do frete.
“Os números mostram que o consumidor está pagando por um preço que vem da grande indústria. São repasses de um custo que ficou muito elevado durante um número muito grande de meses, juntando a gargalos trazidos pela pandemia. Na sequência, tivemos a crise hídrica encarecendo energia e o aumento do preço do barril do petróleo, encarecendo os combustíveis que são responsáveis pelo frete. Todos esses fatores fizeram com que essa pressão de custos refletisse na alta dos itens de vestuário”, explica Braz.
Alguns dos fatores que vinham pressionando os preços já tiveram um arrefecimento, como os combustíveis e a energia, que ficaram mais baratos, principalmente, com a redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). As cotações do algodão e da pluma também estão em queda neste início de outubro, conforme indicou o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea). O Indicador Cepea/Esalq, com pagamento em oito dias, recuou 7,11% na parcial deste mês.
“Agora as condições estão mais favoráveis, porque a gente viu essa queda no preço desses insumos, energia e combustível. Só que essas quedas aconteceram de julho pra cá, então deu-se pouco tempo. Acredito que agora o setor esteja se recuperando das vacas magras de custos extremamente elevados e recompondo margem, exatamente para daqui a pouco também começar a desacelerar”, avalia Braz. Ele acredita que a energia e os combustíveis não devem voltar a subir no curto prazo, evitando assim novos repasses. “Gradualmente, o grupo vestuário deve registrar variações um pouco mais baixas”, acrescenta.
Particularidades
A moda tem suas particularidades, que refletem nas vendas do varejo. Um efeito que costuma encarecer os preços e que não tem a ver com a pressão de custos é a mudança de estações. Com a chegada de uma nova coleção, os itens de vestuário tendem a ficar mais caros, por representarem lançamentos.
“Em geral, essa troca de estação provoca um aumento de preço, mas ele não é duradouro. Alguém pesquisou e investiu numa coleção nova, por isso, ela tende a chegar às lojas mais cara. Acredito que uma parte do que pudemos observar nos preços em setembro represente esse fator. Essa tensão nos preços tende a desacelerar à medida que o verão avançar e que a coleção já não for mais tão nova assim”, pontua Braz, em referência à mudança de estação no mês passado.
Entre os meses de janeiro e fevereiro, as lojas costumam fazer promoções com as peças que sobraram da coleção de alto verão. Em março, é lançada a coleção de outono, e abril tem o foco nas vendas. Em maio, é lançada a coleção de inverno, e as vendas do comércio seguem em junho. Mas há casos em que essas coleções são lançadas juntas: outono/inverno. Outra alternativa, além de esperar as peças deixarem de ser novidade, é aproveitar datas atípicas de promoções, como a Black Friday, que ocorre no fim de novembro.
Correio Braziliense
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