Quase a totalidade dos estados brasileiros gastou em 2017 mais da metade de sua arrecadação líquida com servidores públicos na ativa, aposentados e pensionistas, segundo dados fornecidos pelos governos estaduais e disponibilizados recentemente pela Secretaria do Tesouro Nacional.
A Paraíba gastou em 2017 com servidores ativos e aposentados 58% da receita corrente líquida, descumprindo o milite a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que é de até 49% dos gastos com pessoal. Esse limite é cumprido apenas nos estados: Santa Catarina, Minas Gerais, Acre, Tocantins, Rio de Janeiro e Roraima.
Aos investimentos, ainda de acordo com dados do Tesouro Nacional, restou aos Estados uma parcela de 2% a 12% do total das receitas em 2017. No caso da Paraíba, são apenas 7%.
Somente três unidades da federação (Distrito Federal, Goiás e Sergipe) desembolsaram menos que 50% da receita líquida com esses servidores no ano passado. Em 2016, eram cinco: Distrito Federal, Amapá, Ceará, Mato Grosso do Sul e Sergipe.
Há casos de estados em que os gastos com os servidores ativos, inativos e pensionistas superaram a marca de 60% da receita corrente líquida em 2017, como Minas Gerais (60%), Rio de Janeiro (65%), Tocantins (66%) e Roraima (77%).
Essa conta considera os gastos com servidores de Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público dos estados. A Lei de Responsabilidade Fiscal, porém, estabelece limites individuais para cada um dos poderes.
A receita corrente líquida, considerada para efeitos do cálculo, abate os repasses constitucionais feitos aos municípios e a contribuição dos servidores para o custeio do seu sistema previdenciário.
Impacto nos serviços públicos
Os estados brasileiros são responsáveis por atuar em parceria com os municípios no ensino fundamental, por agir nos atendimentos especializados de saúde e de alta complexidade, além de serem os principais responsáveis pela segurança pública e pelo sistema prisonal.
Para os despesas com saúde e educação, os estados são obrigados a gastar, respectivamente, 12% e 25% de sua receita corrente líquida, segundo a Constituição Federal.
Entretanto, há estados, como o Rio de Janeiro, por exemplo, acusados de não cumprir esse piso constitucional, que tiveram de atender esse requisito por determinação judicial. O estado de São Paulo contabilizou despesas com previdência de inativos nas contas de investimentos com educação, o que gerou uma ressalva em suas contas, apesar de ter cumprido a meta de investimentos determinados pela Constituição na área.
Para as outros setores, como segurança pública, por exemplo, não há um piso constitucional definido.
Segundo o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, o valor gasto pelos estados com servidores públicos ativos e inativos é “absurdamente alto”.
“O problema são os aposentados. Porque os ativos fazem parte do serviço e precisa ter eles lá. Precisa ter professor ativo”, declarou.
Para ele, esse peso alto dos servidores nas contas dos estados gera impacto nos gastos com segurança.
“Têm vários outros segmentos que não são protegidos [pela Constituição]. Um deles, um dos itens mais importantes, é a área de segurança pública. Não tem qualquer proteção e se torna um alvo fácil das políticas de ajuste”, avaliou Velloso.
De acordo com a sócia da consultoria Oliver Wyman, Ana Carla Abrão, ex-secretária de Fazenda do estado de Goiás, o alto valor gasto com pessoal é um dos principais problemas dos estados.
Mesmo assim, ela avaliou que é possível alocar melhor os recursos disponíveis porque há, de acordo com ela, muito espaço para medidas de gestão – com uma melhor análise das necessidades reais de cada estado, além do treinamento e avaliação dos servidores públicos.
Na avaliação da economista, também é necessário levar adiante uma reforma administrativa nos estados brasileiros, discutindo o emaranhado de carreiras e regras distintas de cada uma, além das progressões salariais rápidas, que também podem ser vistas no governo federal.
Custeio e Investimentos
O detalhamento feito pelo Tesouro Nacional mostra também que, com alto valor gastos com servidores, as despesas com custeio também são afetadas. No ano passado, representaram de 18% a 28%, mas neste caso da receita total.
O custeio engloba gastos com remédios, gasolina, material de expediente, uniformes, fardamento, assinaturas de jornais e periódicos; tarifas de energia elétrica, gás, água e esgoto; serviços de comunicação (telefone, telex, correios); fretes e carretos; locação de imóveis, entre outros.
Ana Carla Abrão, ex-secretária de Fazenda de Goiás, avaliou que o baixo volume de recursos disponíveis para custeio, devido ao peso dos gastos com servidores públicos e da falta de planejamento dos estados, também impacta os serviços prestados – pois acaba restando menos dinheiro para comprar remédios, equipamentos de saúde e para realizar reformas nas escolas, por exemplo.
Aos investimentos, ainda de acordo com dados do Tesouro Nacional, restou uma parcela de 2% a 12% do total das receitas em 2017.
O especialista em contas públicas Raul Velloso avaliou que os investimentos estão entre os principais afetados pelo ajuste fiscal nos estados, fruto também do alto valor gasto com servidores.
“Ninguém investe mais. É um absurdo. A infraestrutura está em frangalhos em todos lugares. Os estados não investem nada”, declarou ele.
“Em termos de intensidade, as maiores quedas relativas dos investimentos públicos ocorreram nos estados do Rio de Janeiro, Acre, Espírito Santo e Amazonas. No agregado destes quatro estados o investimento público caiu R$ 10 bilhões de 2014 a 2017”, informou a IFI, em relatório.
A Instituição Fiscal Independente avaliou ainda que Minas Gerais e Roraima estão entre os estados que apresentaram as maiores quedas relativas nos investimentos públicos nos últimos anos.
Tá Na Área com G1
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