Dono de um supermercado de Belo Horizonte usado pela JBS para pagar propina a políticos, o empresário Waldir Rocha Pena revelou, em depoimento sigiloso obtido pelo GLOBO, que fez entregas de dinheiro vivo a um primo do senador Aécio Neves (PSDB-MG), Frederico Pacheco, e a um ex-assessor do senador Zezé Perrella (MDB-MG), Mendherson Souza. Essas entregas, afirmou o empresário, foram feitas em caixas de sabão em pó. Os citados negam as acusações.
O relato corrobora a delação da JBS e constitui mais uma prova de pagamento de propina aos políticos. O depoimento foi dado por Waldir à Receita Federal e enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR), a quem cabe investigar Aécio e Perrella no caso.
As informações prestadas por Waldir também foram compartilhadas com a Polícia Federal de Minas Gerais e usadas na deflagração da Operação Capitu –que apura corrupção no Ministério da Agricultura e prendeu temporariamente o dono da JBS, Joesley Batista, e outros envolvidos no caso.
Em sua delação premiada, o ex-diretor da J&F Ricardo Saud relatou que operacionalizou repasses para Aécio Neves por meio de operações financeiras com um supermercado de Belo Horizonte e a consequente entrega em dinheiro para Frederico. Na delação, Saud revelou ter repassado cerca de R$ 4 milhões para o tucano nessas operações.
Waldir Pena, um dos sócios da empresa Supermercado BH Comércio de Alimentos, confirmou as informações delatadas por Saud e deu novos detalhes ao caso. Embora o empresário não cite valores, a investigação obteve documentos contábeis que apontam que as entregas em dinheiro vivo totalizaram cerca de R$ 6 milhões. As operações foram feitas em 2014, ano eleitoral.
Segundo Waldir, a operação acertada com a JBS “consistiria na disponibilização de recursos em espécie”. Em troca, a JBS emitia certificados de quitações de débitos do supermercado. Ou seja: o supermercado entregava o dinheiro vivo a representantes do grupo, e a JBS abatia esses valores da venda de suas mercadorias para o supermercado.
Frederico e Mendherson se apresentaram para receber o dinheiro como “representantes da JBS”, segundo o empresário. Waldir afirmou que foram feitas quatro entregas de valores.
Segundo o empresário, após a JBS informar a data da entrega, o dinheiro vivo era retirado das lojas dos Supermercados BH e, por meio de transportadoras de valores, levado ao centro de distribuição, onde ficava guardado em um cofre. “No dia das entregas, o dinheiro em espécie era acondicionado em uma caixa de sabão em pó e repassado ao enviado da JBS”, afirmou.
Em seu depoimento, Waldir afirmou que “não sabe a destinação e os beneficiários dos recursos” e que “essas operações foram atípicas e não ocorreram em nenhuma outra oportunidade”. Em conjunto com a Polícia Federal, a Receita Federal busca detectar possíveis ocorrências de crimes tributários e financeiros nas operações.
A PF também ouviu um funcionário da JBS responsável por acertar a operação com os supermercados. Trata-se de Renato Costa, presidente da divisão de carnes da JBS no Brasil. Renato, que não fez delação premiada, disse que apenas cumpriu ordens de um superior, Ricardo Saud, e que fazia questão de não saber os destinatários do dinheiro.
Na Operação Patmos, em maio de 2017, que monitorou entregas de dinheiro feitas pela JBS, os emissários para receber recursos foram também Frederico e Mendherson — ambos chegaram a ser presos pela PF.
Por meio de sua assessoria, Aécio Neves afirmou que “desconhece o assunto”. “Todas as doações recebidas pela campanha nacional do PSDB em 2014 foram legais e estão devidamente declaradas junto à Justiça Eleitoral. As acusações formuladas pelos executivos da JBS já se mostraram mentirosas, o que levou inclusive a PGR a solicitar a rescisão de seus acordos de colaboração”, diz a nota. A assessoria de Zezé Perrella afirmou que não foram encontradas provas que liguem pagamentos da JBS ao senador. Procurada, a defesa de Mendherson classificou de “mentira estúpida” a declaração de Waldir e negou as acusações. A defesa de Frederico Pacheco não respondeu.
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