Laura Ramos de Azevedo, de 36 anos, tem câncer no pulmão, que já chegou aos ossos e ao cérebro. Depois de ter sido internada em fevereiro do ano passado com embolia pulmonar, a consultora de vendas descobriu a doença e passou a tomar um coquetel de 25 remédios. Seus médicos a aconselharam a se aposentar e aproveitar o tempo de vida que restava em casa com seu único filho, Lucas de Azevedo Albino, de 18 anos.
Ela obedeceu. No último dia 30, mãe e filho se preparavam para curtir o domingo na praia, em Mangaratiba, na Costa Verde Fluminense. Quando saiu de casa para chamar a namorada para o passeio, Lucas foi morto por PMs do 41º BPM (Irajá) na entrada da favela da Pedreira, onde ambos moravam. Desde então, Laura afirma que não vai descansar até provar que o filho é inocente.
— Nem que seja a última coisa que eu faça. Pelo meu filho, vale a pena lutar. Tenho pouco tempo, mas vou até o fim — conta a mulher.
Nos últimos dez dias, Laura percorreu toda a favela atrás de testemunhas do crime e de imagens de câmeras de segurança. Ouviu de duas pessoas que o viram ser baleado na garupa de um mototáxi, já perto da casa da namorada, que ele estava consciente ao ser colocado na viatura dos policiais.
— Ele foi baleado de raspão nas costas e colocado dentro da viatura. Uma pessoa que estava no ponto de ônibus viu que ele estava consciente e gritando que não era bandido. Quando chegou ao (Hospital estadual) Carlos Chagas, já estava morto com um tiro na cabeça — afirma Laura, que estava em casa no momento do crime e afirma ter ouvido os tiros.
Laura luta contra o câncer desde 2014, quando foi diagnosticada com um tumor na mama. Fez quimioterapia, teve os seios removidos e, em 2017, achou que havia conseguido vencer a doença. Para marcar a ocasião, fez uma tatuagem com a inscrição “Eu lutei, eu venci” e um laço rosa no ombro esquerdo. No ano passado, após ser internada com embolia pulmonar, recebeu a notícia de que a doença havia se espalhado. Laura cria o filho sozinha desde 2002, quando o pai do menino foi morto durante uma tentativa de assalto quando trabalhava, como motorista de transporte alternativo.
Laura não se esquece da noite em que, em meio ao tratamento do câncer de mama, na tarde de 28 de novembro de 2015, negou o pedido do filho, que queria ir com cinco amigos ao Parque Madureira para comemorar o primeiro emprego de um deles. Na volta à favela, os rapazes foram fuzilados por dezenas de tiros disparados por quatro policiais militares, enquanto passavam pela Estrada João Paulo, em Costa Barros. Quatro policiais militares lotados, à época, no 41º BPM, são acusados do crime, estão presos até hoje e serão levados a júri popular pelo crime.
Morte no caminho
A morte de Lucas foi registrada na Central de Garantias como auto de resistência. Na delegacia, os quatro PMs acusados do crime disseram que foram atacados a tiros por Lucas e pelo mototaxista. Os agentes alegam ainda que encontraram, com Lucas, um radiotransmissor, drogas e uma granada, e que o socorreram para o hospital. Na certidão de óbito de Lucas, consta que a causa de sua morte foi “laceração encefálica, ação pérfuro-contundente”. O adolescente não tinha passagem pela polícia.
Laura desconfia que os policiais executaram seu filho no caminho entre a favela e o Carlos Chagas. Ela afirma ter saído da favela logo após saber que o filho havia sido baleado, às 7h. Chegou no hospital 15 minutos depois. Os agentes só chegaram com Lucas na unidade depois das 7h30. O óbito foi constatado logo após a chegada do adolescente, às 7h32.
— De viatura da Pedreira até o Carlos Chagas num domingo de manhã, sem trânsito, eles não demorariam 15 minutos. Só chegaram meia hora depois — afirma Laura, que dois dias depois do crime, foi, por conta própria, até o Quartel General da PM. Após Laura prestar depoimento, a Corregedoria abriu um inquérito para investigar o caso.
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