Pouco antes das 18 horas do domingo (9), o “The Intercept Brasil” publicou uma série de reportagens (em português e em inglês) com o que diz ser um conjunto de conversas privadas mantidas em aplicativos de mensagem por membros da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba — grupo coordenado pelo procurador Deltan Dallagnol — e pelo ex-juiz do caso e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.
O conteúdo entregue ao portal por uma fonte anônima revela, segundo “The Intercept Brasil”, o posicionamento político do grupo e a combinação de estratégias de ação para impedir que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedesse entrevista antes das eleições presidenciais de 2018 e pudesse colaborar para a campanha do candidato do PT, Fernando Haddad.
Não demorou nem uma hora para que a hashtag #VazaJato, associada à serie de quatro capítulos, pulasse para os primeiros lugares do Twitter Brasil e para que as discussões de WhatsApp se intensificassem. Entre as dúvidas éticas relacionadas à publicação daquele material, já havia incertezas sobre sua veracidade. E a busca por checadores de fatos já começava.
Em dias de notícia quente — seja ela um vazamento de mensagens, uma catástrofe natural, uma eleição ou uma outra urgência qualquer — os sites noticiosos tradicionais tendem a bater recordes de visualização. Foi assim, por exemplo, no dia da morte do ex-governador e candidato à Presidência da República, Eduardo Campos.
Diversas pesquisas indicam que, apesar das críticas e da queda na credibilidade, na hora do “vamos ver”, a população ainda recorre a jornalistas profissionais para ler o que é urgente. As pessoas parecem entender que são eles os profissionais da informação, que dominam técnicas e fontes capazes de trazer um dado de forma mais rápida e acurada.
No domingo, no entanto, foi diferente. Não havia quase nada publicado nos tradicionais sites de notícias do país. Foi só a partir de um posicionamento do Ministério Público, emitido duas horas depois das postagens, que o assunto ganhou fôlego.
Às 20 horas, o órgão soltou uma longa nota.
Sem negar o conteúdo vazado, destacou que os membros da força-tarefa haviam sido “vítimas de ação criminosa de um hacker” e que se sentiam ameaçados. Não só eles como seus familiares. Em seguida, o texto acenava na direção daquilo que costuma acontecer em momentos assim: a onda de notícias falsas.
“É de se esperar que a atividade criminosa [do hacker] continue e avance para deturpar fatos, apresentar fatos retirados de contexto, falsificar integral ou parcialmente informações e disseminar ‘fake news’”.
É hora, então, de alertar o grupo (e também os interessados em geral) para alguns pontos. O primeiro é o fato inegável de que a Lava Jato tem sido alvo de checagens constantes há mais de três anos. Já foram checados réus, delatores, procuradores e o ex-juiz Moro. Também já foram analisadas fotos falsamente relacionadas ao caso, assim como documentos atrelados a ele.
A Agência Lupa, por exemplo, tem em seus arquivos análises sobre as delações do ex-senador Delcídio do Amaral, do ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht Claudio Melo Filho, do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado e do ex-ministro Romero Jucá. Também há textos sobre trechos de depoimentos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de entrevistas do ex-juiz Moro e de discursos do procurador Dallagnol.
O Aos Fatos, por sua vez, já publicou uma série de verdades e mentiras sobre a condenação do ex-presidente Lula e também acompanha de perto a operação. Além disso, é importante ressaltar que conteúdos anônimos e vazados a um único veículo de comunicação fogem do escopo de atuação dos fact-checkers em geral (não só dos brasileiros).
Por não serem dados públicos, passíveis de acesso e conferência, os textos das mensagens publicadas pelo The Intercept Brasil extrapolam a metodologia de trabalho dos verificadores. Não é possível, por exemplo, certificar que as mensagens foram mesmo extraídas dos telefones dos membros da força-tarefa ou do ministro. Nem dizer se seu conteúdo sofreu ou não qualquer modificação.
O que — sim — está ao alcance dos checadores e — sim — será alvo de extrema atenção nas próximas horas é o que diz respeito à verificação de conteúdos relacionados. Falo de eventuais fotos manipuladas, de possíveis frases que não constam no material que foi disponibilizado pelo “The Intercept Brasil”, bem como de falsas reações e/ou falsos anúncios derivados dessa série de reportagens. Sobre isso, não há dúvida de que os fact-checkers atuarão. Mais uma vez, de olho no caldo de desinformação em que surgem as notícias falsas.
Época
Discussion about this post