Três múmias encontradas na Cordilheira dos Andes em 1999 foram usadas na defesa do peruano Paolo Guerrero diante das acusações de doping nas Eliminatórias para a Copa da Rússia. O jogador havia sido suspenso por um ano pelo uso de benzoilecgonina, um metabólito comum à cocaína e folha de coca, na última rodada do torneio, no início de outubro. Seus advogados reverteram a suspensão para seis meses, o que permite que o atacante vá ao Mundial, utilizando muito mais que uma análise esportiva.
A equipe de experts e os advogados de Guerrero, Pedro Fida e Bichara Neto, buscaram um arqueólogo para tentar provar que a substância encontrada no corpo do atleta pode permanecer no organismo por anos. Na realidade, por séculos.
Um estudo realizado por universidades britânicas, peruanas, dinamarquesas e argentinas, publicado em 2013, é a base desse argumento. A avaliação se concentra em três múmias: uma garota de 13 anos, outra de quatro e um menino de cinco. Todos foram encontrados no topo do vulcão Llullaillaco, na Argentina, um dos lugares sagrados para o sacrifício humano entre os incas e localizado a mais de 6,7 mil metros de altitude. Quase que totalmente preservados, os três corpos teriam sido vítimas de capacocha, um ritual tradicional de sacrifício de crianças. Estima-se que elas teriam vivido entre os anos de 1480 e 1532. Uma atenção especial foi dada pelos arqueólogos à garota de 13 anos, chamada de “A Donzela”. Em seu cabelo negro, uma quantidade importante de benzoilecgonina foi encontrada – a cocaína é apenas uma invenção do século 19.
Folhas de coca foram encontradas entre seus dentes e a tese principal dos especialistas é de que a menina foi obrigada a consumir aquele produto antes do sacrifício. Quinhentos anos depois, o produto continua a ser detectado em seu corpo. “Análise do cabelo revela a presença de coca e de benzoilecgonina, o que mostra que todas as três crianças haviam digerido coca”, aponta o estudo. As múmias revelam 7 nanogramas por miligrama de cabelo. Nanograma é a bilionésima parte do grama.
Apesar de ter conseguido uma redução da pena para apenas seis meses, Pedro Fida e sua equipe levarão o caso ao Tribunal Arbitral dos Esportes, onde tentarão isentar o jogador de qualquer punição. As audiências devem ocorrer nas primeiras semanas de 2018.
Estadão
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