Um estudo elaborado e divulgado pela Fundação Osvaldo Cruz, a Fikocruz, atesta que crianças têm baixa taxa de transmissão da Covid-19. Elas têm maior probabilidade de serem infectadas por adultos do que de transmitirem a Covid-19 para eles, ou seja, menos chance de passar o vírus adiante. O indicativo pode ser precioso para reabertura das escolas.
Os pesquisadores investigaram a transmissão da Covid-19 na comunidade de Manguinhos, de maio a setembro de 2020, e mostram que todas as crianças que testaram positivo para o Sars-CoV-2 haviam tido contato com adultos ou adolescentes com sintomas de Covid-19. A coordenadora do estudo, Patrícia Brasil, chefe do Laboratório de Pesquisa Clínica em Doenças Febris Agudas do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas, da Fiocruz, ressalta que os dados se referem a um momento diferente da pandemia, quando a variante P.1, mais transmissível e hoje dominante, ainda não havia surgido. O distanciamento social também era maior do que agora.
No início da pandemia, se acreditava que, a exemplo do que ocorre com a gripe e outras viroses respiratórias, as crianças poderiam ser grandes transmissoras de Covid-19. Contribui para isso o fato de que elas apresentam poucos sintomas e não conseguem seguir como os adultos medidas de higiene e de distanciamento social.
Mas, na prática, não se observou um papel significativo das crianças na propagação da pandemia, embora as escolas tenham permanecido fechadas. As crianças tampouco adoecem significativamente com o coronavírus e são o grupo menos atingido pela pandemia.
Reabertura cuidadosa
Realizado por pesquisadores da Fiocruz, da Universidade da Califórnia e da Escola de Medicina Tropical e Higiene de Londres, o estudo foi aceito para publicação na revista Pediatrics, editada pela Sociedade Americana de Pediatria. Seus dados são importantes num momento em que as escolas do ensino fundamental do município do Rio de Janeiro se preparam para voltar às aulas presenciais amanhã — ao mesmo tempo em que a vacinação dos profissionais de educação está suspensa por falta de doses.
Os cientistas estão cientes dos dois lados do problema. Para eles, não há benefício claro em manter escolas fechadas se estão abertos outros locais onde o risco de contágio é maior, como shoppings, bares e restaurantes. Defendem, porém, que a volta às aulas seja feita, além da já citada vacinação dos profissionais de educação, cuidados de higiene, distanciamento social e uso de máscara.
A epidemiologista da Fiocruz Marilia Sá Carvalho, também autora do estudo, diz que, sem estes cuidados básicos, a reabertura das escolas aumentará a circulação do coronavírus. Mas, se tomadas as precauções, as escolas podem não ter grande impacto na transmissão.
— A criança não é o maior transmissor da Covid-19 — sintetiza Carvalho.
Intitulado “A dinâmica da infecção de Sars-CoV-2 em crianças e contatos domiciliares numa comunidade pobre do Rio de Janeiro”, o estudo analisou dados de 323 crianças (de 0 a 13 anos), 54 adolescentes (14 a 19 anos) e 290 adultos. A base da pesquisa foi o acompanhamento de crianças atendidas no Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz), em Manguinhos. Foram 45 crianças que testaram positivo para o Sars-CoV-2 (13,9% do total).
Os cientistas fizeram visitas às residências dessas crianças e as testaram com PCR (para detectar o coronavírus) e sorologia (em busca de anticorpos que revelassem exposição ao Sars-CoV-2). Adultos e adolescentes que moravam com as crianças atendidas também foram testados.
A hipótese dos pesquisadores era a de que se a transmissão fosse principalmente de adultos e adolescentes para crianças, eles teriam anticorpos antes delas. Foi exatamente o que ocorreu.
Vacinação infantil
Os cientistas ressaltam que mesmo não tendo papel importante na transmissão da Covid-19, é preciso incluir as crianças nos ensaios clínicos de imunizantes.
— Se os adultos forem imunizados e as crianças não, elas podem continuar a perpetuar a epidemia — explica Patrícia Brasil.
Os pesquisadores lembram ainda que em países de alta incidência da Covid-19, como o Brasil, é preciso imunizar no mínimo 85% da população para de fato conter a pandemia. E esse percentual só será alcançado com a inclusão de crianças no programa de vacinação. No Brasil, 25% da população têm menos de 18 anos.
Com informações do jornal O Globo
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