“Reforço a importância do uso da hidroxicloroquina”, escreveu um dos coordenadores da operadora Hapvida. A mensagem foi compartilhada no fim de julho em grupos de WhatsApp de médicos que prestam serviços à empresa, uma das maiores da área de saúde privada do país. “Estamos revisando os prontuários diariamente, estamos vendo que alguns colegas não estão prescrevendo”, afirmou o coordenador, que também é médico.
Ainda na mensagem, ele foi enfático sobre a prescrição do medicamento. “A partir de hoje, TODOS os pacientes irão sair com a medicação da hidroxicloroquina (exceto os contraindicados)”, afirmou. No texto, ele ressaltou que o remédio deve ser entregue até mesmo ao paciente que assinar um termo de recusa da medicação, “para caso, no futuro, mude de ideia”.
Em outra mensagem, o mesmo coordenador afirma que os médicos que não concordarem com a prescrição da hidroxicloroquina podem ser substituídos nos plantões da Hapvida.
As mensagens de WhatsApp às quais a imprensa teve acesso, confirmadas por médicos que prestaram serviços à empresa, ilustram as cobranças relatadas por profissionais do plano de saúde para prescrever hidroxicloroquina em casos de covid-19.
“Eu não queria prescrever hidroxicloroquina a pacientes com a covid-19 porque não é um medicamento aconselhado por entidades de saúde”, conta o médico Mauro à reportagem da BBC, que relata ter sido dispensado pela Hapvida por não concordar com o uso do remédio contra o coronavírus.
Em meio ao escândalo sobre denúncias de supostas ilegalidades da Prevent Senior, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) também apura a conduta de outra empresa na pandemia de covid-19: a Hapvida, a principal operadora de saúde do Nordeste e do Norte e uma das maiores do país.
A ANS, agência reguladora dos planos de saúde, passou a investigar a Hapvida após relatos de que a empresa supostamente pressionava médicos de diferentes locais, para receitar hidroxicloroquina em casos suspeitos ou confirmados de covid-19.
Na manhã da segunda-feira (27/09), a ANS fez “diligências in loco” em sedes da Hapvida. A agência não detalhou quais os materiais que foram alvos e que serão analisados na investigação.
Em 30 de agosto, a ANS começou a investigação contra a Hapvida. “Há processo apuratório em andamento em virtude de denúncia feita por prestador referente à restrição de liberdade profissional, quanto à prescrição de medicamentos”, explica a agência em comunicado à BBC News Brasil.
Em nota à reportagem, a Hapvida nega que tenha feito pressão para o uso da hidroxicloroquina em seus hospitais e afirma que respeita a autonomia médica. “Além disso, a prescrição de quaisquer medicações sempre foi feita de comum acordo, formalizado entre médico e paciente durante consulta”, diz comunicado da empresa.
A ANS também conduz atualmente duas apurações contra a Prevent Senior. As denúncias contra a operadora de saúde não se resumem, como no caso da Hapvida, à suposta imposição do uso de medicamentos sem comprovação contra a doença.
Segundo a ANS, contra a Prevent Senior há uma apuração, aberta em 8 de setembro, “para verificar se os médicos sofreram restrição na sua liberdade profissional” e outra, aberta em 20 de setembro, “para verificar se os beneficiários foram devidamente informados sobre os riscos da utilização dos medicamentos”.
De acordo com um dossiê elaborado de forma anônima por médicos e ex-médicos da Prevent Senior, a empresa também cobrava a utilização de hidroxicloroquina contra a covid-19. O uso do medicamento seria imposto junto com azitromicina, em um “kit covid”.
Outras denúncias contra a empresa, que vieram à tona durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da covid-19, apontam supostas fraudes em um estudo sobre a hidroxicloroquina e ocultação de mortes pela doença.
Em 17 de setembro, a ANS fez diligência na Prevent Senior. A agência afirma que atualmente está analisando a documentação obtida e aguarda respostas sobre um pedido para ter acesso a informações e documentos encaminhados à CPI da covid-19.
A Prevent Senior nega as acusações, alega que o dossiê contra a empresa é fruto de dados roubados e manipulados e pede que a Procuradoria-Geral da República investigue o caso.
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