A cama de hospital onde estava o piloto de avião Glauco Palheta, de 56 anos, foi escoltada por enfermeiros pelos corredores do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo. Dessa vez, o trajeto não era para realizar algum exame de emergência. Ao lado da cama, estava a filha de Glauco, a estudante Gabriela, de 22 anos, de vestido branco e com um buquê na mão.
Assim, pai e filha entraram na cerimônia de casamento que ocorreu num quarto do hospital no último dia 5 de abril. A cerimônia original estava marcada para o final de maio, mas teve de ser adiantada para que Glauco, que estava em estágio terminal de câncer, pudesse participar da celebração. Ele morreu na manhã seguinte ao casamento.
“Eu sei que ele estava esperando só isso para descansar”, disse Gabriela.
Em abril do ano passado, o piloto de avião Glauco Palheta descobriu um câncer de próstata. Em menos de dois meses, o quadro evolui para uma metástase. “A gente fez todo o tratamento, quimioterapia, radioterapia, fez tudo, a gente tinha muita esperança”, contou a jovem.
No início de fevereiro, o câncer foi também para o fígado e o pâncreas, e o quadro se complicou. Há cerca de um mês, a família de Gabriela foi informada de que não havia mais tratamento possível. “Há umas três, quatro semanas, começamos a ser acompanhados pela equipe do paliativo, para casos terminais”.
Com o agravamento do quadro clínico, Gabriela decidiu propor ao noivo, o designer gráfico Thalles Tonini, de 26 anos, que o casamento acontecesse no hospital mesmo. “Conversei com o noivo: ‘Você sabe que o que eu mais quero é ele presente no nosso casamento”.
Após a decisão, os preparativos foram feitos junto com a equipe do Oswaldo Cruz. Para além dos cuidados que a cerimônia dentro do hospital exigia, a pandemia de Covid-19 requereu cuidados redobrados.
O Hospital Oswaldo Cruz possui um programa de humanização chamado “Yes, we care”, que ajuda a realizar pedidos de pacientes internados, principalmente pacientes em tratamento de câncer ou paliativos, ou seja, em fase terminal. Pelo programa, o hospital já realizou outras cerimônias de casamento, e também pedidos mais simples, como um jantar romântico ou mesmo a “visita” do Papai Noel no Natal.
No dia 5 de abril, eles reuniram em um quarto do hospital apenas os noivos, os pais dos noivos, um pastor que fez a celebração, e um dos padrinhos, que tocou a música de entrada da noiva. Todos usavam máscaras para se proteger.
Ao som da música “Pieces”, Gabriela entrou acompanhada do pai, que estava na cama do hospital, empurrada por uma enfermeira. Em poucos dias, ela improvisou o vestido, o buquê, e um cabeleireiro amigo da família fez seu penteado e maquiagem para o dia.
“Dois dias antes do meu casamento, meu pai teve um pico de lucidez que não acontecia há um tempo. Depois, ele falou que o casamento foi maravilhoso”.
No dia seguinte, 6 de abril, o piloto de avião não acordou mais. “Meu pai sempre disse que existe um propósito para tudo, e poder compartilhar isso [o casamento] é uma alegria para a gente”, disse Gabriela. “Para a gente, é uma alegria poder levar esperança e amor para as pessoas”.
G1SãoPaulo
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