Em meio a diversas denúncias de irregularidades em praticamente todos os estados em que atua, a Associação Brasileira de Beneficência Comunitária (ABBC), sediada no estado São Paulo, deve receber dos cofres públicos paraibanos cerca de R$ 150 milhões, recursos esses destinados à administração de unidades de pronto atendimento vinculadas ao Governo do Estado nas cidades de Santa Rita, Princesa Isabel e Guarabira. Dados do Sistema Sagres do Tribunal de Contas do Estado (TCE) mostram que a organização empenhou entre abril de 2014 a dezembro de 2017 mais de R$ 103 milhões, tendo recebido efetivamente mais de R$ 93 milhões.
Pelo levantamento, o volume de recursos empenhados e repassados a ABBC paulista vem crescendo ano a ano e deve chegar a quase R$ 150 milhões. Em 2014, a organização empenhou R$ 16.282.465,85 e recebeu R$ 15.169.946,15; em 2015, dos R$ 27.240.261,00 empenhados recebeu R$ 24.881.200,84; no ano seguinte, de R$ 27.199.229,44 recebeu R$ 24.970.239,25; e, em 2017, de R$ 32.453.532,27 recebeu R$ 28.367.051,84.
Confira os dados do TCE:
O modelo adotado pelo governo Ricardo Coutinho nessas unidades é o mesmo do Trauma, em João Pessoa, e de outros hospitais estaduais. O gestor, que prefere nominar pactuação a terceirização, entende ser ideal a proposta, tanto que não tem medidos esforços em defendê-lo, apesar de inúmeras reclamações e até denúncias.
A ABBC é um exemplo claro de uma entidade eivada de problemas, que vão desde calote a fornecedores, passando por processos trabalhistas obscuros e até suspeitas de corrupção.
Matéria do Diário do Grande ABC denunciou que o presidente da entidade, em 2012, comprou carro de luxo com dinheiro público. Segundo a matéria, o cidadão é especialista em criar várias OSs e ONGs para firmar contratos com o poder público.
Entenda o caso
Em 2012, após a Prefeitura de Ribeirão Pires romper o contrato com a OS chamada OSSPUB, a mesma encerrou suas atividades e fechou a sede localizada no município. Mas, o presidente, Edison Dias Júnior, ativou outras duas organizações e passou a prestar serviço no Interior de São Paulo.
A OSPUB gerenciava o Hospital e Maternidade São Lucas e as oito residências terapêuticas de Ribeirão. O valor da licitação era R$ 29,5 milhões pelo período de 12 meses. O serviço foi prestado entre julho de 2011 e março de 2012.
O rompimento do acordo entre Prefeitura e ONG ocorreu após o Diário do Grande ABC revelar que Edison Dias Júnior comprou um carro de luxo com dinheiro público. Na ocasião, ele utilizou R$ 20 mil que deveriam ser destinados para o pagamento de médicos e deu como entrada em um Toyota Corolla modelo 2011/2012, cujo valor total é R$ 72 mil.
A Justiça passou a investigar o caso. A situação não abalou o empresário, que atua no Interior com o mesmo modus operandi feito no Grande ABC. Após fechar a OSSPUB, Dias ativou a ABBC (Associação Brasileira de Beneficência Comunitária) e o IAPP (Instituto de Apoio a Políticas Públicas). Segundo a reportagem relatou na época, os escritórios das organizações funcionavam em um prédio comercial na Avenida Pereira Barreto, em Santo André. O IAPP, inclusive, encontrava-se dentro da corretora de seguros Red Life, empresa de Angélica Dias, mulher de Edison.
Prefeitura rescinde contrato
No último dia 19 de julho, após funcionários terceirizados da Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) de Sertãozinho (SP) afirmarem que há um ano a empresa responsável não realiza os depósitos do FGTS, inclusive com salários atrasados, a prefeitura local rescindiu o contrato com a organização social Associação Brasileira de Beneficência Comunitária (ABBC).
Problemas apontados
Segundo reportagem do G1, desde a inauguração em agosto de 2015, a UPA era administrada pela ABBC. Antes de iniciar as atividades, o Ministério Público do Trabalho (MPT) chegou a contestar a terceirização dos funcionários.
Segundo os trabalhadores, a ABBC contratou uma segunda empresa para administrar as áreas de limpeza, motoboy, controle de acesso e recepção, mas que o valor do FGTS não foi depositado corretamente.
Contratado em janeiro de 2017 como motoboy, Laudimar Belchior da Fonseca diz que desde o início do trabalho, os salários são pagos com atraso e, há mais de um ano, o extrato do FGTS não acusa os depósitos.
“A ABBC contratou a primeira firma, a El Shaday, há um ano e eles começaram atrasando o salário que nunca caia dia 5, dia 10, nem dia 15. Chegamos a receber no dia 23. Quando chegou no final de 2017, a ABBC contratou a Prosolution. Quando ela entrou, começou a fazer a mesma coisa. A ABBC se responsabilizou de nos pagar o FGTS para a gente não parar de trabalhar, mas isso não foi feito”, afirma.
De acordo com os funcionários, em junho deste ano, uma reunião foi realizada com um advogado da empresa para negociar o parcelamento dos valores atrasados. No entanto, os pagamentos não foram efetivados.
“O advogado da empresa ABBC e outros representantes chegaram a fazer um acordo de parcelamento da rescisão, que seria dividida em quatro parcelas, mas não foi cumprido”, diz Laudimar.
A controladora de acesso Patrícia dos Santos Souza se diz preocupada com a situação. Segundo ela, a empresa anunciou no início de julho que os salários referentes a junho não seriam pagos.
“A empresa disse que não tem dinheiro para nos pagar e passou a opção de sermos transferidos para Lins (SP) ou pedirmos demissão, mas nem o acerto disseram que poderão fazer. Os pagamentos sempre atrasam e isso foi a última gota, saber que não vamos receber o pagamento”, diz.
Na opinião da funcionária, a Prefeitura deveria ter tomado providências e investigado antes a empresa. “Avisamos que as coisas não estavam bem há mais de um ano e nada. Estamos revoltados e indignados e sendo lesados pela segunda vez. Não sei como vou fazer para pagar as minhas contas.”
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