Ex-presidente do Peru ,Alan García morreu cerca de três horas depois de ter atirado contra a própria cabeça diante de uma ordem de prisão preventiva por dez dias emitida pela Justiça. García, de 69 anos, havia sido levado para o hospital Casimiro Ulloa. Ele era um dos dos quatro ex-chefes de Estado do Peru investigados sob a acusação de terem recebido suborno da construtora brasileira Odebrecht, mas negava a acusação de corrupção.— Nesta manhã ocorreu este lamentável acidente: o presidente tomou a decisão de atirar em si mesmo — disse a jornalistas o advogado de García, Erasmo Reyna, na porta do Hospital de Emergências Casimiro Ulloa, em Lima.
O secretário pessoal de García, Ricardo Pinedo, confirmou que o ex-presidente entrou em seu quarto depois de ser informado que um promotor batia à porta de sua casa levando a ordem de prisão. Segundo Reyna, ele foi submetido a uma operação, mas não resistiu.
Orador habilidoso que liderou por décadas um partido tradicional do Peru, o Apra (Aliança Popular Revolucionária Americana), García governou o país como um nacionalista de 1985 a 1990 antes de se reinventar como um defensor do livre mercado e ganhar um novo mandato de cinco anos em 2006. No ano passado, ele pediu asilo político ao Uruguai depois de uma ordem judicial que o proibiu de sair do Peru, para evitar que fugisse ou interferisse nas investigações do caso Odebrecht. Montevidéu não aderiu à tese de perseguição política e rejeitou a solicitação.
O caso contra ele faz parte da chamada Lava-Jato peruana e avançou após a delação premiada do advogado brasileiro José Américo Spinola, que afirmou no Brasil ter pago US$ 100 mil a García a pedido da Odebrecht . García afirma que recebeu o dinheiro como pagamento de uma palestra feita na Fiesp, em São Paulo, sem nenhuma relação com corrupção.
— Se estou impedido de sair do país já é uma forma de prisão. Já não posso ir a nenhuma conferência, não posso assistir a nenhuma reunião. Estou, de alguma maneira, atado — disse recentemente García.
Minutos depois da morte, o presidente do Peru, Martín Vizcarra, se disse “consternado” em mensagem em uma rede social: “Envio minhas condolências a sua famíilia e seus entes queridos.”
O caso Odebrecht no Peru
Além de García, a investigação sobre subornos da Odebrecht no Peru envolve também os ex-presidentes Alejandro Toledo (2001-2006), Ollanta Humala (2011-2016) e Pedro Pablo Kuczynski (2016-2018). Todos estão sob investigação do Ministério Público peruano.
Kuczynski, de 80 anos, foi preso preventivamente por dez dias no início deste mês e nesta quarta-feira foi hospitalizado após sofrer uma crise de hipertensão arterial. Toledo, que supostamente recebeu US$ 20 milhões da empreiteira pela construção de uma rodovia, vive nos Estados Unidos. E Humala, que foi preso preventivamente no ano passado, atualmente aguarda julgamento em liberdade.
O escândalo também atingiu as ex-candidatas Lourdes Flores e Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000), em prisão preventiva desde 31 de outubro.
A ordem judicial de detenção desta quarta-feira também afeta outras oito pessoas: o ex-ministro de Transportes Enrique Cornejo, Luis Nava, seu filho José Antonio Nava, Miguel Atala, seu filho Samir Atala, Oswaldo Plasencia Contreras, Jorge Menacho e Raúl Antonio Torres. Luis Nava, que foi ministro de García, teria recebido US$ 4 milhões da Odebrecht que, segundo os promotores peruanos, eram destinados ao ex-presidente.
Em fevereiro, a Odebrecht assinou um acordo de cooperação com a Procuradoria peruana em São Paulo para ampliar as investigações sobre pagamentos ilícitos no país andino.
Ficou então definido que a empresa teria que pagar cerca de US$ 182 milhões como compensação civil aos peruanos, com base em quatro licitações que venceu mediante o pagamento de subornos a autoridades locais. A empreiteira já admitira em 2016 que havia pagado propinas na casa dos US$ 29 milhões entre 2005 e 2014 no país.
O Peru é o oitavo país com o qual a Odebrecht firmou um acordo de colaboração. Negociações semelhantes ocorreram com o Brasil, os Estados Unidos, a Suíça, a República Dominicana, o Panamá, o Equador e a Guatemala.
Em dezembro, o presidente Martín Vizcarra, rejeitou a possibilidade dacontinuação das operações da Odebrecht no país, sob a alegação de que as práticas corruptas da empresa provocaram sérios estragos. Vizcarra assumiu a Presidência em 2018 depois da renúncia de Pedro Paulo Kuczynski, que sofria uma ameaça de impeachment. Apesar das críticas, Vizcarra afirmou que respeita o pacto dos promotores com a Odebrecht.
Fonte: Jornal O Globo
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