O valor dos grandes homens mede-se pela importância dos serviços prestados à humanidade. A frese atribuída a Voltaire poderia emoldurar o epitáfio de um dos mais respeitados profissionais da medicina paraibana que nos deixou ontem, infelizmente. Após o desaparecimento prematuro de Doutor Ugo Guimarães, a morte de José Eymard Moraes de Medeiros é mais um duro e cruel golpe não só para a classe médica, mas na sociedade, sobretudo.
Ao tomar conhecimento de sua morte, lembrei do primeiro contato, lá pelos idos de 1999, ainda quando comandava a saúde municipal da Capital. Naquela ocasião, estudante de jornalismo da UFPB, entrevistei-o para a rádio Tabajara, emissora a qual estagiava e por onde incursionei os primeiros passos profissionais. Diante de um gestor cuidadoso e que fazia questão de prestar todas as informações possíveis sobre a Pasta que chefiava, pude ver de perto a preocupação de alguém vocacionado em cuidar das pessoas, especialmente as mais necessitadas dos serviços públicos de saúde.
Anos depois, nas graciosas e benfazejas coincidências da vida, reencontramo-nos na campanha pelo comando da Unimed João Pessoa, oportunidade em que fui um dos seus assessores nas áreas de comunicação e marketing. Numa disputa desigual, Dr. Zé Eymard, como assim o chamava, não logrou êxito no sonho de presidir a cooperativa que ajudou a fundar no passado, juntamente com Alberto Urquiza Wanderley, Reginaldo Tavares, José Juvêncio de Almeida Filho e tantos outros expoentes, embora tenha plantado as sementes que germinariam quatro anos mais tarde, desta feita pelas mãos de Alexandre Magno Pimentel, responsável por apear do poder o até então todo poderoso presidente da cooperativa, Aucélio Gusmão.
Na sequência, em virtude de alguns problemas de saúde, passei a ser seu paciente. Doutor Zé Eymard era um dos poucos profissionais com quem mais me abria e tinha confiança. Mesmo não sendo sua especialidade, foi pelas suas mãos que muitas vezes recorri para sanar desconfortos momentâneos causados pelo cálculo renal. Aliás, com ajuda dele, passei a cuidar mais da saúde, praticar exercícios e ter uma alimentação mais regrada, com menos óleo e gordura, tudo para evitar elevação de gordura no fígado ou, como bem registrava em seus precisos diagnósticos, a malfadada e indigesta esteatose hepática.
Mas foi num dos momentos mais delicados da vida que pude testemunhar seu lado mais humano. Após uma madrugada em claro no Hospital da Unimed com a minha esposa Patricia, queixosa de dores intermitentes e cada vez mais agudas, peguei o telefone e, por volta das 5h, contatei-o em busca de socorro, o que prontamente fui atendido em pouco mais de 5o minutos. O médico, a quem sempre confiei as minhas dores, aparece no Pronto Atendimento do hospital, vasculha todos os exames, cancela outros tantos desnecessários, analisa e pede um beta para fechar o diagnóstico. Pronto, horas depois, pelas suas mãos, Patricia era levada ao centro cirúrgico por um dos seus ex-alunos, o Dr. Marcelo Rique, cirurgião do aparelho digestivo e que foi escalado pelo meste para conter um sangramento causado pelo rompimento de uma das trompas, tendo como origem uma uma gravidez ectópica.
Um profissional à toda prova e um humanista profundo, Doutor Zé Eymard exercia a medicina como sacerdócio e não como negócio. Não era mais um, e sim um médico preocupado em exercer a medicina pelo orgulho de ser médic, algo cada vez raro em tempos de mercantilização da profissão. Para ele, medicar e receitar exames nunca foram fins em si mesmo. Pelo contrário, orientar, escutar, observar, distribuir atenção e carinho eram premissas basilares de sua atuação no consultório, na gestão e, sobretudo, na vida, seja com sua esposa, filhos, netos, amigos e, para não fugir a regra, pacientes.
A medicina ou ciência médica concede um poder exponencial ao profissional para desafiar limites e o valor potencial desse poder é o que certamente sempre inspirou pessoas como Doutor Eymard, cuja trajetória sempre esteve em sintonia com os proclames externados por Hipócrates, cujo juramento até hoje é referencial para os estudantes que assumem a sublime missão de cuidar e salvar vidas.
Em sua segunda carta a igreja de Timóteo, no verso quatro, Paulo acentua: “combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé”. A escrita bíblica é o bastante para ilustrar a vida desse grande paraibano e brasileiro, na certeza de que seu legado seja reverenciado como fonte inesgotável de inspiração para essa e as futuras gerações.
José Eymard Moraes de Medeiros, o nome a obra imortaliza.
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