As redes sociais foram infestadas, aqui e acolá, de inúmeras manifestações de ódio aos judeus nos últimos dias. Embora não seja algo novo, uma vez que o antissemitismo sempre fora um problema histórico, a repetição dessas ultrajantes manifestações envergonham a trajetória e colocam em xeque a própria humanidade.
De antemão, aos mais desavisados, gostaria de acentuar que o presente escrito não abordará o contrataque de Israel ao Hamas, tampouco o conflito entre judeus e palestinos, embora o escriba compreenda que a guerra é a demonstração mais eloquente de que a humanidade está sempre caminhando para trás, dada sua incapacidade de exercer aquilo que poderia ser mais simples, o exercício da razão por meio do diálogo para mediação, composição desfazimento de conflitos. Todos são perdedores numa guerra, a começar pela verdade, vilipendiada por narrativas de parte a parte.
Dito isso, é preciso observar que o antissemitismo não é algo novo ou mesmo da fundação do Estado de Israel, no século passado, mas que nasce como uma expressão da fé, tendo em vista que a igreja católica, a partir do quarto século, começou a combater a usura, isto é, a cobrança de juros sobre empréstimos. Como os judeus não estavam sujeitos às leis canônicas cristãs, muitos sobreviviam do empréstimo de dinheiro com juros, o que era incompreendido pela igreja da época, sobretudo na Idade Média, quando o Império Romano passou a obrigar os judeus a pagarem altos impostos, sem falar no confisco de bens e até o não pagamento de empréstimos pelos cristãos.
Por séculos, o ódio aos judeus foi propagado, sobretudo na associação aos negócios. Como os judeus eram proibidos de possuir terra ou exercer cargos públicos, inúmeros se dedicavam à atividade comercial. Nos momentos de crise, aristocratas e senhores feudais saíam espalhando, mais uma vez, que eles eram gananciosos, mercenários, desrespeitosos com a tradição, incultos e hereges. Todos esses estereótipos moldaram a imagem dos judeus por séculos.
Os judeus foram expulsos dos mais diferentes lugares. Foi assim na Inglaterra, em 1290. Na França, em 1394. Na Espanha, em 1492. Portugal, em 1496… Mesmo quando não eram expulsos, em quase todos os países europeus, os judeus também eram proibidos de ter empregados ou se casar com não-judeus. Muitos foram submetidos à conversão força da para o cristianismo. Só com a chegada do Iluminismo, no século 19, foi quando os judeus passaram a ser assimilados à vida social na Europa. Desde então, mesmo pequena, a comunidade judaica europeia influenciou o mundo de diferentes maneiras, com figuras como Freud, Marx, Einstein e Kafka.
Contudo, a chaga do antissemitismo jamais deixou de existir. O Holocausto, sem dúvidas, foi a maior chaga dessa vergonhosa história de perseguições, indiferenças e incompreensões com o povo judeu.
A criação do Estado de Israel, em 1948, intensificou ainda mais esses problemas. Muitos judeus que viviam em países árabes sofreram consequências duríssimas, inclusive leis foram promulgadas restringindo os direitos desse povo, congelando seus bens ou os excluindo de certos empregos e posições. Quase 1 milhão de judeus deixaram esses países árabes e o próprio Oriente Médio para viver em países como o Brasil, onde a colônia judaica é bastante numerosa a partir de São Paulo.
Não soa estranho, diante desse breve cenário histórico, que a resposta de Israel ao virulento e infame ataque do Hamas seja tão questionado nos últimos dias. A verdade é que o antissemitismo é uma chaga do passado, uma espécie de fantasma pronto a assustar a qualquer hora o mundo.
É nosso papel combater esse grande mal, repelir qualquer comportamento que estimule ou propague essa deletéria e irracional manifestação de ódio, e procurar corrigir os erros que tantas vidas custaram no curso da nossa história.
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