Ilicitude
Por Luís Fernando Veríssimo
Duas leis em gestação se arrastam na direção de Brasília para nascer. As duas trarão grande alegria para o califado brasileiro, se passarem, ou grande decepção pra o califado se o Congresso, numa demonstração de grandeza insuspeitada, as rejeitar. As duas leis se complementariam. Uma instalaria no Brasil o princípio do excludente de ilicitude, que em qualquer país civilizado do mundo significaria um retrocesso jurídico vergonhoso e aqui passa por progresso. A outra propõe uma reforma agrária que finalmente viria, mas ao contrário: polícia e Forças Armadas estariam autorizadas a atirar primeiro e determinar que ilícito foi cometido pelo agricultor sem terra depois, a critério do dono da terra, muitas vezes baldia e improdutiva.
A história da luta pela terra no país está cheia de sangue, e a maior parte é sangue de quem só pedia um pouco de chão para trabalhar. Por sinal, você se lembra da última vez em que viu notícias de acampamentos e colônias do MST produtivos e bem-sucedidos no país? E eles existem. Agora, se passar a lei que arma e perdoa os proprietários por todas as suas ilicitudes, notícias da guerra serão mais frequentes e sangrentas.
O Congresso pode reagir aos projetos, matá-los, proteger, ainda que debilitado, a democracia e zelar pela sua própria biografia. É difícil que o faça. Todas as forças do califado estarão do outro lado.
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