O anúncio da candidatura do ex-governador Ricardo Coutinho (PSB) não surpreende, porque as circunstâncias não lhe davam outras opções. Abandonar o silêncio estratégico dos últimos tempos era tão pragmático como a própria trajetória do socialista, que certamente viu o ingresso na disputa de 15 de novembro a oportunidade de ‘ouro’ de enfrentar as denúncias de corrupção que pipocam aqui e acolá.
Aliás, é justamente no movediço terreno da política, no qual é doutor honoris causa, que o ‘comandante em chefe’ do antigo ‘coletivo girassol’ ou que sobrou dele busca transformar a campanha eleitoral num ‘tribunal de salvo conduto’, com teses e narrativas criadas e produzidas para sua absolvição sumária. Na prática, Coutinho pretende mostrar ao distinto público que tudo que foi dito, mostrado, investigado e até aqui denunciado pela Força Tarefa à frente da Operação Calvário foi uma grande conspiração dos seus adversários, conhecidos ou não, incluindo Ministério Público, Justiça e correlatos.
Pragmatismo à parte, o ingresso do socialista na disputa revela outra característica do seu controverso caráter, a incapacidade de respeitar interesses contrários aos seus, ainda que legitimadas por deliberações democráticas. A intervenção nos diretórios municipal e estadual do PT apenas para tão somente atender a sua exclusiva vontade, reforça o traço autoritário do agora pré-candidato do PSB à Prefeitura de João Pessoa.
Na verdade, a posição de Ricardo Coutinho em buscar a intervenção do PT Nacional, passando por cima das instâncias de uma agremiação que sequer é a sua e que tinha uma outra postulação, a do deputado estadual Anísio Maia, apenas ratifica o histórico personalista e autocrata de um político que sempre teve como marca indelével a contradição de seus gestos, atitudes e palavras.
Aliás, se voltarmos um pouco no tempo, ainda quando estava no PT, Coutinho tentou atropelar o partido diversas vezes para impo-se candidato. Foi assim em 2000, com Luiz Couto, e 2004, com Avenzoar, ano em que migrou para o PSB. Eleito, tomou o partido de Nadja Palitot e passou a comandá-lo com mãos de ferro, que o diga o saudoso Luciano Agra, a quem tentou ‘atropelar’ sem dó nem piedade durante o pleito de 2012.
E se as idéias de Coutinho nunca corresponderam aos fatos, parafrasearia Cazuza, quem o conhece de perto sabe que o autoritarismo que tanto costuma transferir aos adversários, a exemplo do presidente Jair Bolsonaro, de quem tanto faz questão de divergir, não é apenas uma característica de sua controvertida personalidade, mas uma tatuagem encrustada no curso de uma jornada de mais de 30 anos na política, em que conseguiu mais desafetos que aliados.
Certa vez, num dos debates da campanha de 2010, o então governador, na época candidato à reeleição José Maranhão, atual senador pelo MDB, acusou o líder girassol de padecer da ‘síndrome da transferência de culpa’, um distúrbio psíquico-mental que faz com que o paciente aponte sempre para o outro a culpa por algo de errado feito por ele ou que não deu certo, o que se amolda bem ao ‘manequim’ psicológico e ao prontuário neurológico do ex-governador.
E se de um lado o diagnóstico psicológico do ex-governador está bastante fechado, do outro, o político, fica ainda mais delicado após toda essa confusão criada no PT.
Sempre disse, inclusive muito tempo antes do tímido anúncio do que sobrou do coletivo girassol, que sempre fez muita festa para as incursões políticas do seu comandante em chefe, que até o meu cachorro, Pingo, ganharia a eleição do ex-governador num eventual segundo turno. Não que Pingo, o meu cachorro, fosse competitivo a tal ponto de derrotar alguém que já foi vereador, prefeito e governador, mas pela forma como entra na disputa.
Ricardo tem todo o direito de disputar a eleição e tem todas as condições de chegar num eventual segundo turno, dada a fragmentação de candidaturas, 12 ou 13 ao todo. O problema é ganhar quando já começou perdendo.
Mas, ao que tudo indica, ganhar não é e nunca será o objetivo do ex-governador nessa eleição. Coutinho quer, como disse, aproveitar a oportunidade para manter-se vivo, embora já encarne, mesmo sem ainda se dar conta, o papel de ‘cadáver’ político que a história lhe reservará ao final dessa peleja.
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