A história de três mães na luta para proteger os filhos revelaram, em menos de 24 horas, tristes realidades da vida na Região Metropolitana do Rio: a rotina de violência e da falência do sistema público de saúde.
Na manhã desta quinta-feira (7), uma mulher chorava a falta de medicamento que pode matar o filho, para quem ela já doou o próprio rim. Outra mãe morreu ao infartar vendo o corpo do filho, executado pouco antes, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Na noite de quarta (6), uma mulher também morreu, atingida por uma bala perdida enquanto preparava o almoço para as duas filhas, dentro de casa, no Morro da Coroa.
A vítima do tiro sem rumo foi Alessandra dos Santos Soares, de 27 anos. Gravemente ferida, ainda teve a preocupação de proteger uma das meninas, de 3 anos.
“Ela ainda deu umas últimas palavras. Meu irmão perguntou: ‘Esse tiro pegou em você?’. Ela disse que sim. E falou assim: ‘Tira minha filha daqui'”, contou, muito emocionada, a cunhada Maria Alves.
A casa da família fica perto de uma praça conhecida como Amor de Mãe, na parte alta do Morro da Coroa. Alessandra ainda estava amamentando a filha mais nova, recém-nascida. Apesar do esforço de proteção de Alessandra, a mais velha está traumatizada.
“Ontem, eu fiquei com a filhinha de 3 anos. Ela não conseguia dormir. ‘Cadê a minha mãe?’ Quatro horas da manhã acordada porque viu o fato que ocorreu”, contou a cunhada.
Dor que mata
Outro crime tirou duas vidas de uma mesma família, em uma história trágica. Primeiro, criminosos renderam e executaram com vários tiros o policial militar Douglas Fontes em Caxias – foi o 54º PM assassinado em 2018 no estado. Pouco depois, ao ver o corpo do filho, Maria Fontes sofreu um infarto e também morreu.
No Dia das Mães, como mostrou o RJTV, Maria José usou as redes sociais para se declarar pelos filhos. “São o bem mais precioso que possuo. Por isso, Pai, eu te peço: cuide deles para mim”.
De acordo com a polícia, Douglas foi morto depois que os criminosos descobriram que ele era policial. O PM foi obrigado a deitar no chão e foi executado. A namorada nada sofreu. Ele estava na PM há 12 anos. Era divorciado e deixa dois filhos, um de 8 e uma de 5. A Divisão de Homicídios também está responsável pelo caso.
Alessandra trabalhava como auxiliar de limpeza. Estava de licença-maternidade e tinha acabado de tirar férias para continuar cuidando da bebê.
A comunidade é uma das dezenas que convivem com tiroteios. Moradores contaram ao G1 que Alessandra foi baleada quando traficantes dispararam contra policiais do Batalhão de Choque. A PM não confirmou que militares da unidade estavam na comunidade. A Divisão de Homicídios investiga o caso.
“Quem for tem que pagar. De onde partiu aquele tiro que destruiu a vida dela, do meu irmão e da nossa família? Peço ao estado: clemência. Não abandone a população. Ajude a encontrar o assassino que matou minha cunhada”, cobra a cunhada.
“A minha mãe chegar ao ponto de ver o filho como ela viu, eu sabia que ela não resistiria”, destacou Romulo Fontes ao sair do IML de Duque de Caxias após cuidar dos papéis para o enterro da mãe e do irmão.
Sacrifício e lágrimas
Outra mãe sobrevive em uma batalha heroica. Há mais de 20 anos, Eliana Gomes foi doadora de rim para o filho, que tem uma vida normal se conseguir tomar seus medicamentos. Mas, sem remédios nas unidades de saúde públicas, a luta dela fica ainda mais difícil.
Na manhã desta quarta, ela foi à Farmácia Estadual de Medicamentos (Rio Farmes), como tem feito há três meses, mas deixou o local mais uma vez de mãos vazias.
“Meu filho está correndo risco de perder o rim e até morrer. E aí, queria saber: eu vou cobrar de quem se isso acontecer? Ontem [quarta-feira] saí daqui desesperada. Vim para cá de manhã, que era a data marcada para pegar o medicamento. Mas, todos os meses, sou remarcada para o mês seguinte e sem levar o remédio, que está faltando há três meses”, contou.
Eliana disse que está vivendo de doações das associações e dos grupos de rede sociais, o que permite conseguir o remédio somente para dois ou três dias. Segundo ela, tem de ser uma corrida diária por ajuda.
“É desumano o que estão fazendo com a gente. É crime. É nosso direito dos transplantados. Quando meu filho transplantou foi uma felicidade e agora, o que eu faço para ele manter esse rim?”, indagou Eliana, que anda muito nervosa.
A Rio Farmes segue dando a mesma resposta que deu em abril para a produção do Bom Dia Rio. Que a Ciclosporina está em falta e, por isso, há atraso na entrega do medicamento aos pacientes. Agora, em junho, a resposta se repete, e a Rio Farmes informa que entrou em contato com o fornecedor para saber o que está causado esse atraso.
G1
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