O segundo bloqueio do aplicativo WhatsApp no Brasil (o primeiro aconteceu em dezembro do ano passado) deixa evidente um conflito que não está restrito à Justiça brasileira. Embora a suspensão do aplicativo não seja algo corriqueiro pelo mundo, a briga entre empresas de tecnologia e a Justiça é algo cada vez mais comum não só por aqui. Companhias como Apple e Facebook têm se enfrentado com governos e sistemas judiciários de diversos países. Esse é um fenômeno recente, porque a troca de informações e a comunicação entre pessoas de diferentes países de forma tão intensa também é algo relativamente novo. Os tratados de cooperação entre países, por exemplo, não previam crimes cibernéticos.
No caso recente do bloqueio, o que a Justiça brasileira está querendo é submeter uma empresa com sede nos EUA às regras brasileiras. Faz sentido, claro, porque a empresa está atuando aqui. O problema é que a Justiça está pedindo ao WhatsApp dados que ou a empresa não tem ou não é obrigada a fornecer. O sistema do WhatsApp passou a criptografar todas as mensagens. Assim que um usuário manda uma mensagem, ela passa pelo servidor da companhia, que a entrega para o telefone de outro usuário. Quando a mensagem é entregue, o serviço apaga o conteúdo. O WhatsApp não guarda backups das mensagens nos seus servidores.
Adriano Mendes, advogado especializado em direito digital, explica que uma maneira de fazer a Justiça brasileira ser mais rápida e eficiente em casos como esse seria a adesão do Brasil a tratados internacionais de cibercrime. Um deles é a convenção de Budapeste, firmada em 2001. Para os países que assinaram a convenção, ela permite a troca de informações de fontes digitais e online entre polícias de todo o mundo. O Brasil, porém, ficou de fora do acordo.
Ao fazer parte de um tratado como esse, aumentariam as chances de a Justiça brasileira ter acesso à informação que está buscando. Se o pedido tivesse feito diretamente à empresa nos EUA, por exemplo, Mendes acredita que a Justiça poderia ter tido acesso a algumas informações, como com quem o suspeito trocou mensagens e quantas mensagens foram trocadas. Mas não teria acesso, de qualquer forma, ao conteúdo das mensagens.
Enquanto a Justiça tenta encontrar formas de saber o conteúdo das mensagens trocadas no aplicativo, as empresas estão se munindo para preservar ainda mais a privacidade dos usuários. Depois de encriptar as mensagens de texto, há uma expectativa de que o WhatsApp passe a fazer o mesmo com suas ligações. O Facebook também quer fazer um sistema de segurança semelhante no Messenger, seu aplicativo para troca de mensagens de texto e voz. O Snapchat, que tem feito muito sucesso no Brasil, também trabalha em um sistema de encriptação.
A criptografia é eficiente: evita que pessoas não autorizadas tenham acesso a informações particulares. É legítimo que empresas como Facebook, WhatsApp e Apple queiram defender a privacidade. Isso não significa que elas querem atrapalhar a vida dos governos e da Justiça. Afinal, o governo é um ente soberano, mas não é um Big Brother que pode bisbilhotar a vida de todos sem autorização.
Epocanegocios
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