O jornalista Ivandro Oliveira, diretor de Conteúdo do Tá na Área, analisa o caso Empreender e mostra que a ação que pode cassar o governador Ricardo Coutinho (PSB) é uma prova inconteste de que a justiça falha, também, quando tarda. Confira:
Caso Empreender prova que justiça que tarda é uma que também falha
Do latim Tandem óbtinet iustitia, a expressão “a Justiça falha, mas não tarda” é um bordão incorporado pela sociedade brasileira e muito presente no senso comum das pessoas, embora, na verdade, seja uma grande inversão de valores. Ora, a justiça falha justamente por tardar, uma vez que a função axiológica das penas judiciais nas sociedades civilizadas não é apenas punir a quem comete crimes, mas mostrar para o conjunto da sociedade que o crime não compensa.
Lamentavelmente, por uma série de fatores, muitas vezes pouco ou nada republicanos, não é o que ocorre quando o Poder Judiciário se mostra inerte e ineficiente à punição rápida e eficaz de delitos e seus autores.
A Ação de Investigação Judiciária Eleitoral (AIJE) sobre a utilização com fins políticos e eleitorais do programa de microcrédito Empreender, cujo processo contém, desde um parecer da Controladoria-Geral do Estado (CGE), apontando irregularidades na aplicação de recursos , especialmente no ano da eleição de 2014, como dezenas de depoimentos, alguns em vídeo, de pessoas beneficiadas em todo o estado, inclusive com casos em que o beneficiário confirma ter recebido o dinheiro para votar no governador Ricardo Coutinho, então candidato à reeleição pelo PSB, é por demais emblemático.
Após quatro anos de espera e apenas três meses para o final do mandato do governador Ricardo Coutinho, eis que o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) decide iniciar o julgamento da ação que pede a cassação e a inelegibilidade do socialista por oito anos por de abuso de poder político e econômico, com base num parecer consubstanciado e composto por 217 páginas assinado pelo procurador federal Victor Veggi.
O caso Empreender é daqueles casos escabrosos, que fere de morte o princípio da razoabilidade processual e que salta os olhos de quem tem o mínimo de bom senso. Para se ter uma ideia, a ação está tramitando no TRE há nada menos do que quatro anos. O juiz Carlos Beltrão é o quarto relator dessa ação, que iniciou com o desembargador João Alves, passou, na sequência, para os desembargadores Maria das Graças Guedes e Romero Marcelo.
A AIJE do Empreender não é só uma ação complexa, mas extremamente grave, que traz o relato de centenas de testemunhas em todo o estado, um relatório da Controladoria Geral do Estado apontando várias irregularidades na liberação dos recursos em ano eleitoral e até um vídeo com o governador, gravado em pleno período eleitoral, assinando um cheque gigantesco simbólico e entregando outros (de verdade) para dezenas de pessoas vestidas com camisetas com a marca do Empreender PB.
Não fosse o bastante, após as eleições de 2014, um vídeo, em que uma moradora de São José de Caiana, no Vale do Piancó, admitiu o ilícito. Nele, fica sinalizado que o vereador Ronildo Silva de Moura (PSB), também presidente da Câmara, recebeu mais de R$ 5 mil num único contrato, e ainda beneficiou 26 parentes.
No vídeo, Fabiana Costa, cunhada do vereador, confirmou ter recebido dois contratos (um pra ela, outro pra seu marido), no valor acima de R$5 mil, e confirma que seu marido, por ser irmão do vereador Ronildo, “conseguiu dois (cheques)”. No vídeo Fabiana admitiu que votou em Ricardo Coutinho, por causa do cheque: “Um monte de gente, assim, vai votar (em Ricardo) por causa desse empréstimo.”
A verdade é que independentemente do desfecho, os prejuízos inúmeros e incontáveis até aqui podem ter sido absurdamente maiores e danosos não só do ponto de vista da lisura daquele pleito, mas da própria democracia, que se alimenta da vontade popular manifestada livre e soberanamente apartada de vícios e artimanhas fraudulentas.
Nesse caso, qualquer que seja a decisão da Corte Eleitoral a partir de segunda-feira, 1º de outubro, o tempo não só foi vilão de todo um longo processo de mais de quatro anos, como tornou o dano absolutamente irreparável, daí a conclusão de que a justiça não só falha no erro, mas quando simplesmente tarda.
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