O ex-governador Ricardo Coutinho (PSB), que sempre foi um ardoroso crítico do pagamento de pensões a ex-gestores estaduais, curiosamente está na lista dos agraciados do ‘benefício’, segundo dados do Ministério Público de Contas. O órgão, ligado ao Tribunal de Contas do Estado (TCE), quer pôr um ponto final no pagamento de pensões a ex-governadores e protocolou uma representação na corte com um pedido de Medica Cautelar para fazer valer decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que, em julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4562), considerou, por unanimidade, inconstitucional.
Outra curiosidade é que a orientação do pagamento do benefício a Ricardo Coutinho e aos demais ex-governadores foi feito pela Secretaria de Administração e foi concedido na época em que a secretária ainda era Livânia Farias. A ex-auxiliar do governo, como se sabe, pediu exoneração do cargo em 16 de março, ao ser presa no bojo da operação Calvário, deflagrada pelo Ministério Público nos estados do Rio de Janeiro e Paraíba, que identificou organização criminosa responsável por desvio de recursos da saúde pública, através de contratos com a Organização Social Cruz Vermelha.
De acordo com informações da Secretaria de Administração, Ricardo teria recebido o pagamento em janeiro e fevereiro deste ano. “O Sr. Ricardo Vieira Coutinho, um dos beneficiários da pensão especial reconhecida inconstitucional pelo STF, estava no exercício da Chefia do Executivo Estadual e ao deixar o cargo de Governador, em 31.12.2018, não poderia usufruir do subsídio mensal e vitalício em foco, notadamente em razão do decisório prolatado pelo Excelso Pretório na multicitada Ação Direta de Inconstitucionalidade, à época já em vigor”, destaca o MPC.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4562) foi julgada pelo Supremo em 17 de outubro do ano passado e, por unanimidade, foi considerada inconstitucional. A ação foi protocolada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seguindo procedimento adotado em relação aos estados do Pará, Acre, Amazonas, Rondônia, Sergipe, Paraná, Rio Grande do Sul e Piauí.
A lei considerada inconstitucional pelo Supremo foi criada por emenda constitucional em 2006 (nº 21/2006). Ela dizia que “cessada a investidura no cargo de Governador do Estado, quem tiver exercido em caráter permanente fará jus a um subsídio mensal vitalício, a título de pensão especial, pago com recursos do Tesouro Estadual, igual ao do Chefe do Poder Executivo”. Por conta disso, cada um dos ex-governadores da Paraíba vivos, mesmo os que governaram apenas por nove meses (Cícero Lucena, Milton Cabral e Roberto Paulino) recebem remuneração igual à do governador João Azevêdo (PSB). Ou seja, R$ 23.500,82. O impacto disso nas contas públicas é de R$ 1,5 milhão por ano. Se for contabilizada a pensão das viúvas, soma-se mais R$ 1 milhão na conta.
O Ministério Público de Contas entende que a continuidade dos pagamentos é indevida. E não apenas a Ricardo, concedida depois da inconstitucionalidade decretada pelo Supremo. Os procuradores alegam que a eficácia para esse tipo de julgamento é ex tunc, ou seja, produz seus efeitos para dizer que “a lei é inconstitucional desde o dia em que surgiu no ordenamento. Percebemos aí um vício de origem na lei (metaforicamente em seu ‘DNA’), pois a mesma já nasce inconstitucional. O STF, então, declara a nulidade da lei mediante uma sentença eminentemente declaratória dotada, como já dito, de efeitos que são eminentemente retroativos”. E tem razão para isso, quando se leva em conta o teor do acórdão da ADI 4562.
Nele, o ministro relator Celso de Mello cita a jurisprudência do Supremo para afirmar que o benefício de que fala a decisão “não se tratava, em sua acepção jurídica, nem de subsídio, nem de vencimento, nem de provento, nem de vantagem, nem de aposentadoria ou qualquer outro benefício de índole previdenciária”. Citando voto da ministra Carmen Lúcia em julgamento anterior, Mello acrescentou: “Aquele que não esteja titularizando cargo eletivo de Governador do Estado, extinto que tenha sido o mandato, não pode receber do povo pagamento por trabalho que já não presta, diferentemente de qualquer outro agente público, que – ressalvada a aposentação nas condições constitucionais e legais estatuídas – não dispõe de tal privilégio.
Depois de publicado o acórdão do Supremo, a Assembleia Legislativa da Paraíba protocolou embargo no STF. O Ministério Público de Contas entende que, mesmo assim, TCE pode determinar o fim dos pagamentos. “Em verdade, a enfocada benesse afronta básicos postulados constitucionais, a exemplo da IMPESSOALIDADE e MORALIDADE, mediante indevida outorga de tratamento privilegiado a cidadãos que não mais se encontram no exercício da função pública, devendo este Tribunal de Contas impedir a assunção de gastos públicos pela Administração Estadual com base em norma declarada inconstitucional pelo STF em decisão de caráter vinculante”, ressaltam os procuradores na representação.
O procurador-geral do Estado, Gilberto Carneiro, disse acreditar que a corte de contas não é a instância adequada para questionar os pagamentos. “Entendo que o TCE não tem competência para isso. A matéria está sendo apreciada no âmbito do STF quantos aos efeitos da decisão, mediante embargos que foram interpostos do acórdão que declarou inconstitucional a pensão. Os embargos foram justamente para o STF esclarecer se os efeitos da extinção da pensão é ex nunc (daqui por diante) ou ex tunc (para trás). Qualquer decisão do TCE seria precipitada neste momento”, ressaltou.
Confira a relação:
Com blog do Suetoni
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